domingo, 10 de abril de 2011

O lado psicopata de cada um de nós

Não posso me furtar a comentar a tragédia no Rio de Janeiro. Tenho aversão à corrente do mal como já comentei em uma crônica anterior. O mundo inteiro só falando sobre desgraça é um prato cheio para os canais de comunicação que transmitem ao vivo toda a barbaridade. Nada dá tanto IBOPE quanto uma catástrofe de proporções gigantescas.
Desta vez não deu para escapar imune das más notícias, embora eu fuja de fatos que não acrescentem nada e que apenas contribuem para gerar uma vibe prá lá de negativa. Só soube do massacre às oito horas da noite, depois que todos os canais de televisão, internet e rádios noticiaram repetidamente o tenebroso evento durante todo o dia. Não vi uma só imagem, li no Portal de notícias na Internet e fiquei chocada como qualquer pessoa em sã consciência ficaria.
O terror que abalou o Brasil nesta semana me fez pensar que todos nós temos um lado psicopata. O que nos difere deste rapaz insano é apenas o grau de psicopatia.
O que leva um jovem de 24 anos que aparentemente teve uma família presente, frequentou a escola e que tudo leva a crer teve uma formação religiosa, a entrar numa escola premeditadamente para exterminar a sangue frio dezenas de crianças? O que passa pela cabeça de um ser que desenvolve uma estratégia tão minuciosa, um plano perfeito, para assassinar jovens inocentes? Maquinou tudo com antecedência. Conseguiu comprar as armas ilegalmente.Treinou tiro ao alvo. Uma pontaria certeira. Mirou e atirou exatamente aonde queria sem qualquer chance de defesa para nenhuma das vítimas. Ele queria chamar a atenção?  Do que exatamente?
Há poucos anos, outro jovem surtou dentro de uma sala de cinema num Shopping de São Paulo alvejando a plateia no meio da exibição de um filme. Entrou com uma arma, já sabia o que ia fazer, não agiu por impulso. Apesar de ainda estar vivo nunca ninguém conseguir descobrir a razão, acho que nem ele sabe.
Até agora ninguém reclamou pelo corpo do rapaz alucinado que ainda está no IML. Não tem família nem amigos. A sorte da família deste infeliz é que ele não tem família. Se os pais estivessem vivos seriam linchados pelo povo que precisa culpar alguém, quando a responsabilidade só pertence única e exclusivamente a este ser desprovido de moral e valores.
Psiquiatras e psicólogos estão em todos os jornais. A mídia está sedenta por uma teoria que justifique o ato surreal, como se alguém tivesse conhecimento de causa para explicar algo tão tresloucado. As mais elucubradas teorias são explanadas, estatísticas de assassinatos no mundo inteiro estampam os jornais. Os religiosos acreditam que o jovem assassino estaria tomado pelo demo.
O que ninguém comentou é que este jovem perturbado levava uma vida normal. Morava em um bairro cheio de gente, trabalhava, andava pelas ruas como um cidadão comum, ia à padaria, supermercado, falava bom dia, boa tarde e as pessoas respondiam. Como eu, como você. Minha filha perguntou hoje para mim – Mãe, por que este cara estava solto?  Como ninguém internou este maluco num hospital psiquiátrico? Eu respondi – Porque ele nunca apresentou um comportamento que oferecesse risco à sociedade. Imagine o seguinte, eu aparentemente sou normal, certo?  De repente, eu entro num supermercado e atiro para todos os lados.  Alguém vai poder indagar o motivo pelo qual eu andava livre, leve e solta por aí? Mas eu era normal, concorda?  Este jovem não era ladrão, não pertencia a uma quadrilha, nunca foi preso, não tinha nenhum antecedente criminal. Qual a diferença entre ele e eu? O grau de loucura.
Esta desgraça me fez sentir medo. Medo do que está perto de mim. Medo do que está longe de mim. Medo de mim mesma.
Quem de nós nunca surtou? No trânsito revelamos nosso lado mais sombrio e primitivo. Somos desrespeitados todos os dias, quando estamos numa fila no mercado que tem 24 caixas e apenas 2 funcionando, quando compramos um produto que vem com um defeito e parecemos bolinhas de ping pong pulando entre a loja e o fabricante para resolver a questão. Todos nós fomos um dia rejeitados. Uma paixão avassaladora que acaba do dia para noite sem nenhuma explicação. Quantos já não sofreram bullying na infância ou adolescência? A diferença é que nossa consciência fala mais alto, nossos valores estão mais arraigados e por prevenção não andamos armados. Se o porte de arma fosse liberado a qualquer um o índice de homicídios seria mais assustador do que já é e por motivos frívolos.
Há séculos o sábio ditado popular já nos ensinava que de médico e louco todo mundo tem um pouco. E temos mesmo. Todos tem manias, implicâncias, cismas, superstições e idiossincrasias só que não dão vazão as suas mais pervertidas ideias. Quem uma vez o outro não teve vontade de ar asas à imaginação ou aos seus desejos mais reprimidos que não são aceitos pela sociedade. Ainda prevalece entre as pessoas de bom senso a lei moral – não faça ao outro o que você não quer façam com você.
Esta desgraça que assolou todo o país serve de alerta para todos nós. Somos pretensiosos ao acreditar que temos tudo sob controle.  Não temos nenhum poder sobre os outros, somente em relação a nós mesmos. Na dúvida, quando eu acordar com os nervos a flor da pele, vou respirar fundo e me enclausurar, será mais seguro.

Marot Gandolfi

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