quarta-feira, 2 de março de 2011

Medo de dizer a verdade

Todos os pais, até os mais descolados e liberais, lá no fundinho sonham com o futuro de seus filhos.
Sou rapa do tacho, minha irmã era 14 anos mais velha que eu. Duas filhas únicas do mesmo casamento. Fui mimada até dizer chega, excesso de cuidado, amor, paparicos e de exigências também. Meus longos cabelos lisos sem chapinha eram enfeitados com fitas (de gosto duvidoso). Usava sapatos de verniz e meias ¾ tão brancas que ofuscavam a vista de qualquer ser. Meu uniforme era tão engomado que ganhei por anos consecutivos o prêmio da aluna com o uniforme mais impecável de todo o colégio. Morria de vergonha por isso! Não havia negociação com estudo. No mínimo as melhores notas. Sem acordo.
Imagine com este cenário o que pode ser pior do que contar para seus pais que você está grávida, solteira, aos 17 anos? Até hoje não encarei uma saia tão justa.
Foi a primeira vez que vi meu pai chorar como uma criança. Soluçava. Aquilo acabou comigo.
Minha mãe quando soube, não derramou uma lágrima. Só disse - Filha, pare de chorar, não quero que meu neto ou minha neta nasça triste.
Minha irmã ouviu minha mãe falando e disse com uma alegria indígena - Eba! Vou ter um sobrinho. Ela nem poderia imaginar que era um menino.
Fiquei numa sinuca de bico para contar para minha avó. Uma mulher séria, enérgica, com ela não era brincadeira. Uma italiana de pulso forte.
Enrolei, desconversei, até que não deu mais para adiar. Chamei-a para uma conversa no meu quarto e falei que eu tinha que contar uma coisa terrível para ela. Preparei o terreno e expliquei que iria ficar decepcionada e muito brava. Ela secamente disse – Vamos logo, desembucha. Eu falei – Vó, é a pior notícia que você poderia receber. Estou grávida. Eu cobri meu rosto com as mãos para não ver a reação de horror no rosto dela. Nem meio segundo depois ela pronunciou – Desde quando ter um filho é a pior coisa do mundo, menina? Você vai viver a emoção mais maravilhosa que uma mulher pode ter. Conte comigo.
Chorei copiosamente. Ela também.
Família de loucos, não? Sofri por antecipação. Tive a sensação mais terna e segura que alguém pode ter na vida, os braços abertos de acolhimento e carinho de uma família.
O sentido de família é isso. Todos juntos em qualquer roubada.
Marot Gandolfi









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