sexta-feira, 25 de março de 2011

Duelo Bizarro

Todos nós temos acomodados confortavelmente em nossos ombros um Diabinho de um lado e o Anjinho do outro. Fiéis escudeiros. Grudados com Super Bonder.

Se ficassem mudos como uma porta até que dava para suportar o peso. São maritacas no cio, não param de falar um só segundo.

Confesso que o vermelhinho com um tridente na mãozinha me dá ideias tentadoras e fascinantes. Vive sussurrando ao pé do meu ouvido e tem um bafinho tão doce, mas tão doce que é quase irresistível. Deve ser publicitário ou advogado, o sem- vergonha.

Cada vez que eu estou no limite, com a água batendo no nariz, o danado surge das cinzas e apavora.

Me vejo travada num trânsito infernal, maneira de dizer ainda não decidi se vou ficar com meu companheiro carmim, levo mais de duas horas para andar apenas míseros 11 quilômetros. Já não aguento escutar nenhuma música, tenho vontade de socar o rádio, acabou o cigarro, não tem nenhum líquido para sorver. Estou surtando.

Prato cheio para o demo. Ele me atiça, safado. Bota lenha na fogueira. Jogue tudo para o alto, mude para João Pessoa, compre uma bicicleta para andar por lá, escreva o seu livro à beira mar. Vá sua covarde, vá fundo. Você só tem a ganhar. Gaste R$ 1000,00 num dia de spa. Compre aquele vestido que você amou. Depois você vê como paga. Eu dou jeito para tudo.


São tantos conselhos pérfidos que não sei qual sigo primeiro – Vou ou não vou? Compro um apartamento ou uma calça de veludo?

Neste momento de indecisão paranóica entra em cena o chato de plantão – o anjinho. Cara mais asqueroso. Sempre dando uma de bonzinho, pentelho. O rei da razão. O sabe tudo. Com aquelas asas frenéticas e seu olhar de peixe morto fica falando em looping – Você não pode largar tudo sem consequências, minha filha. Tem muita gente que depende de você. E seus boletos, os malditos boletos, quem vai pagar? E o trabalho que você faz 12 horas por dia? E o marido, os filhos, o cachorro, o papagaio, a fome na Etiópia, o terremoto no Japão,a crise industrial na Europa, a Copa em 2014 no Brasil? Você vai sentir culpa. Ah! A marvada de novo.

É o cão chupando manga do avesso. Ele tem a capacidade de jogar água fria sempre que elaboro as fantasias mais mundanas do universo. Para meu azar, escuto mais este camarada que de camarada não tem nadinha. Está a anos luz de ser um amigo do peito. É um amigo da onça, isso sim.

Um ser sem graça, sem sal, sem tempero, que vive a vagar. Não dança, não enche a cara, não dá gargalhadas, não vai a baladas, nem canta para seus males espantar. Dance e cante que nem gente, meu amigo. Solte o Fred Astaire que tem dentro de você. Ria muito principalmente de você mesmo.

Ainda não tive coragem suficiente de aceitar as maléficas sugestões do ser vermelho, alegre e pulsante. Ele me faz cócegas, instiga meus sonhos mais primitivos, mas até agora só o outro chato de galocha tem vencido a parada. Um duelo bizarro!

O único consolo e que estou no começo dos 45 do segundo tempo. Ainda dá tempo de dar uma virada.



Marot Gandolfi
















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