Deveríamos nascer com um botão para ouvir só aquilo que presta. A quantidade desumana de porcarias que escuto todos os dias me faz muitas vezes chacoalhar o crânio para desentupir os ouvidos, como se pudesse colocar para fora toda aquela tranqueira. Jogar no lixo orgânico para não correr o risco de reciclagem. Daquela baboseira nada serve mesmo.
Conheço pessoas que têm ouvido de tuberculoso. Ouvem a uma distância impressionante normalmente aquilo que não deveriam escutar. Antenas parabólicas da melhor qualidade, com ISO. Captam todos os sons em todas as frequências em qualquer volume. Crianças são a melhor espécie.
Existem seres com uma audição mais aprimorada. Aqueles que possuem ouvidos seletivos. Escutam só aquilo que convém. Tenho dois espécimes em casa. Lavar louça, guardar a roupa, ajudar a colocar ou tirar a mesa fazem parte daquilo que nunca escutam.
Tenho um tio que é surdo há muito tempo. Usa aparelho e tem uma técnica infalível. Quando começa a ouvir aquilo que não tem o menor interesse, seja de quem for, simplesmente mexe no botãozinho do aparelho não ouve nada e faz cara de paisagem. Faz isso sem o menor constrangimento. Hilário.
Precisei fazer duas cirurgias nas cordas vocais por motivos óbvios. Foram usadas a exaustão e se suicidaram, coitadinhas. Minha otorrino ao examinar meus ouvidos declara – Nunca vi canais auditivos tão lindos, tão perfeitos. Olhei para a criatura insana e disse – Posso trocar por um abdômen tanquinho? Quem vai olhar dentro da minha orelha? Só minha mãe fazia isso quando era pequena para saber se eu tinha lavado no banho. E nunca me disse que eram bonitos os meus canais auditivos. Tenha dó.
Decidi que vou adotar a estratégia da audição seletiva. Não ocuparei meus poucos neurônios para processar asneiras. Sobrará mais espaço para dizer insanidades e escrever abobrinhas.
Marot Gandolfi
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