quinta-feira, 10 de fevereiro de 2011

O temido ócio

Sempre saio como uma louca da aldeia para ir a uma reunião. No melhor estilo de tirar o pai da forca.
Tenho todo o esquema planejado minuciosamente. De 5 a 7 minutos para tomar o café da manhã, 20 minutos para o banho, secar o cabelo, maquiagem e me vestir, 15 minutos para fazer banco via internet e quando dá tempo baixar os e-mails. Levando em consideração esta planilha cronológica cumprida minuciosamente, para não chegar atrasada, o que abomino de todas as formas, me programo para sair sempre com uma hora de antecedência, dependendo do percurso, mesmo que o trajeto possa ser feito em 30 minutos. Afinal, vivemos nesta selva, tem motoqueiro caído na Marginal, um caminhão quebrado, uma obra, uma blitz em horário de rush. O problema que sou multifunção, logo multiconfusão e, na maioria das vezes, esqueço chave, documento, celular.  Outro dia, sai e descobri na esquina, ainda bem, que estava sem sapatos.
Como não me permito ter tempo ocioso, aproveito o caminho para fazer ligações com fone de ouvido, colocar o trabalho em dia, fazer follow up, check up, e mais ups por aí a fora.
Semana passada fiz tudo isso, correndo, com delineador nos olhos, de salto alto sempre e para desgraça geral da nação, sobrou tempo. Ai Jesus e agora?
Peguei a Castelo Branco livre, leve e solta. Um tapete. Um convite a dirigir sem parar nunca mais. Dirigir sem destino, ouvindo uma música atrás da outra, um cigarrinho aqui, outro ali. Revivendo o blockbuster On the Road de Jack Kerouac. Já sonhei em fazer isso várias vezes e tenho como meta, quem sabe um dia.
Mas não desta vez. Eu não sabia simplesmente o que fazer com o tempo que sobrou e que caiu de mão beijada no meu colo. O universo conspirou ao meu favor. Me deu preciosos minutinhos de graça, assim sem mais ou menos. Ao invés de aproveitar, fiquei me perguntando: E agora, o que eu faço? Definitivamente, o ócio não foi feito para mim. Sinto culpa quando tenho um tempinho. Culpa, aquela praga que me assombra todos os minutos do dia. Suspeito que a culpa da fome no mundo seja minha.
Vivi momentos de agonia. Chorei convulsivamente. Dá para acreditar? Uma insana, dirigindo numa estrada, a 120 km por hora, aos prantos. Resultado: maquiagem toda borrada, falta de ar, cansaço logo no começo do dia.
Meu lema é bola pra frente que atrás vem gente. Sei que é um desafio hercúleo aproveitar estes momentos, mesmo raros, sem fazer absolutamente nada. Até que o tal do ócio pode de verdade ser muito criativo. Afinal, saiu esta crônica.
Marot Gandolfi

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